O Andejo Vadio: março 2010
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"I always wonder why birds choose to stay in the same place when they can fly anywhere on the Earth. Then I ask myself the same question."
(Harun Yahya)

terça-feira, 30 de março de 2010

'Solo' em solo estrangeiro!

Hoje venho a vocês com boas e más notícias!

Comecemos pelas más: Estou novamente sozinho. Na manhã seguinte ao acampamento perto de Aguas Dulces o Alexandre voltou a ter os problemas de visão que o atrapalharam logo no começo da nossa viagem e por isso, abatido, decidiu voltar para casa. Já havíamos tomado cada um o seu caminho, para lados opostos da estrada, quando ele voltou atrás e decidiu seguir viagem, ao menos até o fim do mundo, também conhecido como Ushuaia, cidade mais austral do globo, na Terra do Fogo. Assim continuamos juntos e como descrevi na última postagem, fomos a La Paloma. De lá, não fomos muito longe, visto que saímos bem tarde da cidade e duas caronas nos levaram até um posto de combustível no cruzamento da Ruta 9 com a Ruta 10, na cidade de Rocha. Animador, pois podemos tomar um banho. Comemos uma gororoba qualquer (fizemos uma sopa e cozinhamos o arroz dentro dela), e acampamos novamente na beira da estrada. Ao acordarmos no dia seguinte veio a decisão: Ele realmente voltaria para casa; as manchas na visão tinham aparentemente piorado em relação ao dia anterior e ele não viu alternativa a não ser abandonar a viagem. Fiquei meio sem saber como agir, mas tentei não influenciar em sua decisão.

Como consequência do ocorrido, não poderei contar com alguns equipamentos úteis que ele providencialmente tinha, entre eles: fogareiro e gás para cozinhar, bússola para nos localizarmos nas frequentes idas a florestas e lugares ermos, cantil, do qual eu já senti na pele a falta e principalmente a máquina fotográfica; já me doeu não poder tirar fotos de Punta del Este que é a praia mais luxuosa que já estive, imagino quando não puder registrar minha presença em lugares como Península Valdez, Glaciar Perito Moreno, Deserto do Atacama, Lago Titicaca e Machu Picchu. Terei que registrar esses momentos apenas na memória. Além é claro do óbvio que é perder a companhia, que além de tornar a viagem mais segura, tornava-a muito mais agradável e suportável; é muito mais fácil passar horas na beira da estrada esperando carona conversando com alguém.

Mas sonho é sonho, e por mais que os instantes seguintes a notícia de que seguiria sozinho, já fui logo reanimado, na medida do possível. Entramos juntos ainda em Rocha, para procurar uma Lan House, por aqui chamada de Cyber (ciber), para passar as fotos que estavam na máquina para o meu pen drive e passar as fotos que estavam no pen drive para a máquina. Ele foi fazer isso e eu fiquei terminando de ler as aventuras de Robinson Crusoé. Ele terminou com as fotos, e eu não com o livro. Nos despedimos e ele partiu, e não mais o vi, e nem tive notícias suas até o momento. Cinco minutos depois terminei o livro, e por um instante não sabia que rumo tomar, afinal o sempre indeciso libriano tinha até o momento ajuda para se decidir. Resolvi então também ir ao cyber e repassar as novidades para minha família e assim o fiz. E aí é que começam as boas notícias. Recebi uma resposta a um email que muito me animou: o site Couch Surfing deu frutos e uma família de um balneário próximo de Montevidéo disse que ficaria satisfeita em me acolher.

Decidi então respirar fundo, levantar daquela cadeira e continuar viagem. Com duas caronas, a primeira com o carro mais chique que eu ousei subir durante essa viagem, um Subaru Forester 4x4 que o motorista, Mário, utilizava para visitar sua casa em Cabo Polônio, lugar apenas acessível para veículos com tração nas 4 rodas, onde pegava sua lancha e saía para pescar. Me levou até sua pequena mansão em La Barra, praia vizinha a Punta del Este, porém não cheguei a entrar e caminhei pela rua principal dessa requintada praia, que é repleta de ateliers e galerias de arte. A segunda carona do dia, em compensação, foi num passat velho e caindo aos pedaços, mas não podendo ser injusto, foi tão providencial como a primeira ao passo que foi essa que me levou até o coração do paraíso da luxúria que é Punta del Este, a praia mais cara da América do Sul. Prédios enormes, sem muros, com imensos gramados regados o tempo todo por irrigadores automáticos que disperdiçam água de forma absurdamente irresponsável. Item também utilizado nas mansões que deixam as do entorno do parque barigui no chinelo, essas, em sua maioria pois não posso provar sua totalidade, têm até nome. Visitei um loja da Ducati, o farol da cidade e também o porto, que serve mais para os pescadores e para guardar a infinidade de iates e veleiros do que para qualquer outra atividade comercial, ao menos a primeira vista.

Devido aos recentes acontecimentos não consegui dormir durante a noite, tendo gasto parte dela invadindo um restaurante a beira do mar onde tinha um local aparentemente reservado onde tirei uns cochilos, na cadeira de uma loja de conveniência de um posto Petrobrás, tentando, sem sucesso, dormir um pouco mais, e em sua maioria vagando pela noite, andando pela suas pomposas ruas escuras. Ao amanhacer já estava fora da cidade e três caronas entre elas as duas últimas com Leonardo e Nelson, muito agradáveis, me trouxeram até El Pinar, balneário próximo de Montevidéo.

Amanhã e depois vou até o centro da cidade conhecer tudo que for possível para disfrutar da capital mais segura da América Latina. Outra coisa bacana, no mesmo período em que estarei aqui, a Rossana e o Nacho, meus anfitriões junto com seus dois filhos Santiago, 5, e Lara, 3, receberão outros viajantes, entre eles 4 argentinos (1 casal e mais duas meninas) e 1 casal de brasileiros, e assim a casa ficará cheia!

Tento postar de novo na sexta-feira de manhã, antes de deixar a casa e seguir viagem. Daqui irei a Colonia del Sacramento e depois subirei até Paysandú para cruzar a fronteira pelo simples motivo de que não tenho grana suficiente para pagar uma passagem de barco entre Colônia e Buenos Aires!

Vou colocar no ar as últimas fotos que tiramos, e assim que eu arranjar mais da câmera de outros eu as colocarei também.

Em breve mais notícias, do agora vadio solitário,

Andejo

domingo, 28 de março de 2010

Enfim palavras que nao entendo!

Bueno, começo esta postagem esclarecendo que durante toda minha viagem terei problemas de acentuaçao, afinal no espanhol só se usa til no "n".

Começando de onde parei, digo que nao conseguimos ir a Tavares na terça-feira, mas sim na quarta, de carona com Nilson, um caminhoneiro muito gente fina que depois de algumas horas de viagem nos deixou na empresa do tio da Bina, Roberto. Havíamos anteriormente falado com a tia dela, Rosane, esposa do Roberto e combinamos algumas coisas sobre nossa estadia em Tavares, entao já chegamos lá ligeiramente combinados, sendo que logo encontramos com o Roberto que nos levou a sua casa à beira da lagoa dos patos, lugar incrivelmente lindo.

Até aí estava tudo ótimo, porém, diferente do que contávamos, nao conseguimos um trabalho por alí e assim nos vemos no momento quase sem dinheiro e loucos para trabalhar. Sendo assim nao tínhamos porque continuar em Tavares, e já no dia seguinte nos dirigimos ao sul, primeiro levado por um caminhao que transporta arroz e depois, coincidentemente, pelo irmao da Rosane, Renato, que nos levou a Sao José do Norte, onde pegamos uma balsa para Rio Grande.

Alí achei um Itaú, e pude verificar que realmente estou próximo da falência. Saquei mais algum dinheiro para poder trocar quando chegássemos na fronteira e seguimos viagem, um ônibus e uma carona nos levaram ao trevo de saída da cidade em direçao a Chuí. Chegamos tarde por ali e quase perdemos as esperanças de seguir viagem quando anoiteceu, mas como nao tínhamos para onde ir, resolvemos continuar pedindo carona até mais tarde, e para nossa incrível surpresa e felicidade um caminhao parou, o nome do motorista: Alex. Cara gente fina, muito louco, nos entreteu durante toda a viagem com suas próprias histórias de viagem. Ele estava transportando bananas até Montevidéo. Chegamos em Chuí perto das 22h e fomos até um posto, local que ele nos pagou uma janta e nos indicou um local para acampar: a marquise de um supermercado desativado, e ali mesmo passamos a noite.

Dia seguinte utilizamos pra resolver algumas coisas em Chuí antes de cruzarmos para Chuy, lado uruguaio da cidade, como o Alexandre sacar dinheiro, trocar reais por pesos, arrumar minha mochila, colar as bandeirinhas nas mochilas (uma uruguaia, sem querer ou nao, colou as bandeiras do Brasil de ponta cabeça em nossas mochilas, mas só percebemos depois) e por aí a fora, mas lá pelas 16h cruzamos a aduana uruguaia e carimbamos nossos passaportes pela primeira vez.

Já oficialmente no Uruguai, só pegamos caronas em caçambas, o que nao parece ser proibido por aqui, assim como andar de moto sem capacete. A primeira nos levou, por sorte, até nosso objetivo, Parque Sante Tereza, local que conseguimos burlar o sistema e acampar de graça, com auxílio das duas mulheres que nos deram carona e de alguns militares uruguaios. O lugar é lindo e bem conservado, e pessoas vao para lá acampar durante toda a semana.

Para sair do parque sem pagar utilizamos a praia, por onde caminhamos por uns 8km até Punta del Diablo. Chegamos mortos mas mesmo assím conhecemos a cidade que é muito aconchegante e as praias que sao muito bonitas. Mesmo exaustos por caminhar durante tanto tempo com nossas pesadas mochilas, fomos procurar trabalho: achamos apenas um, porém com estadia e comida em troca do trabalho, e só para 1 de nós. Decidimos entao continuar viagem e no mesmo dia pegamos mais 4 caronas que nos levaram até Águas Dulces. Rapidamente conhecemos a cidade e com outra carona fomos até a Ruta 10, e por alí estacionamos; horas e horas pedindo carona sem sucesso. Uma senhora de uma fazenda em frente de onde estávamos nos arranjou pao, mortadela e água, e isso foi nosso jantar. Acampamos no meio do mato, entre umas árvores, na beira da estrada.

E finalmente chegamos ao dia de hoje. Logo durante a manha pegamos apenas uma carona que nos trouxe até La Paloma, uma cidade com lindas casas e de ar muito interessante. Rodamos também por aqui, tiramos algumas fotos e já estamos de partida, agora em direçao a Punta del Este, e em seguida Montevidéo. Ainda nao sabemos como faremos, estou esperando resposta de alguns contatos que fiz na capital do país para conseguir lugar para ficar gratuitamente, pois se tivérmos que ficar em um hostel gastaremos quase todo nosso dinheiro. Estamos cortando algumas cidades uruguais do roteiro e tentaremos entrar na Argentina o quanto antes, porque lá o câmbio nos favorece muito mais do que aqui. Nossa única chance de permanecer mais tempo no Uruguai é se acharmos um trabalho e um local para ficarmos em Montividéo.

Bom pessoal, agora tenho que ir porque aqui onde estou é 40 pesos a hora, ou seja, uma boa parcela de tudo o que temos!

Grande abraço a todos e espero trazer melhores horizontes na próxima postagem!

Do agora internacional,

Andejo

segunda-feira, 22 de março de 2010

Desplanejamento

O velho andejo descritivo voltou, deixando assim de lado a crônica, na tentativa de mostrar a vocês quão confuso foram os últimos dias, que por ventura me trouxeram novamente à casa da Bina e do Paragua em Canoas - sim, eu sei, visito-os tanto ou mais do que as igrejas, não é uma escolha, rs!

Diferente do que planejava, porém como eu imaginava, algo extraordinário aconteceu. Nada de muito especial, porém nada nesta viagem é ordinário ou regrado. Sairíamos de Caxias do Sul na segunda-feira, com a carona de uma de nossas anfitriãs na cidade, rumo a Três Coroas, local em que visitaríamos o templo budista Chagdud Gonpa Khadro Ling. Porém, Vanessinha, nossa anfitriã em questão teve um compromisso inadiável de última hora e teve de permanercer em Caxias até o dia seguinte, não é mesmo senhorita?

Entretanto, sem mais percalços - ao menos por enquanto - seguimos no dia seguinte ao templo nomeado a cima, este que significa Morada das Dançarinas do Céu, e fica numa região afastada do centro da pequena cidade que o sedia. Lá ficamos poucos instantes, afinal, ao final da tarde deverímos procurar um lugar para dormir, já que não o conseguimos no próprio templo. Assim caminhamos até a estrada próxima, e mesmo sem esperança devido ao horário, conseguimos uma carona até a pequena e receptiva cidade de São Francisco de Paula, impressão causada pelos bombeiros locais, Dias, Kleber e Roque, que nos acolheram em seu posto, dando-nos comida, chuveiro e cama para passar a fria noite na serra gaúcha. Inclusive nos convidaram a permanecer ali por uns dias e conhecer as belezas da região, convite que educadamente recusamos. Porém os momentos ali foram interessantes, com música, indagações sobre nossa crença em ovnis - vimos inclusive uma filmagem de um suposto ovni nos céus da região - conversas sobre acidentes na perigosa serra da Rota do Sol e sobre supostas pessoas idênticas a nós mesmos.

Apesar de muito bem recebidos, não tardamos a seguir viagem no dia seguinte, inicialmente com intúito de ir até Cambará do Sul para encarar os canions outrora deixados de lado. Decidimos os recolocar em nosso roteiro a fim de reencontrar o Paraguaçu, que supostamente traria um blusa que eu havia esquecido em Floripa, cidade em que ele passava férias na ocasião. Porém, como já estamos nos acostumamos, não somos senhores de nosso destino, e depois de uma carona que nos levou até Tainhas, uma outra nos levou até perto de Torres, e uma terceira nos deixou na entrada da cidade praiana.

Novamente fomos muito bem recebidos pelos ilústres universitários da cidade, Guilherme e Rafael, que novamente cederam suas casa para nosso abrigo e base. Dormimos por ali e no outro dia de manhã seguimos, apenas com uma mochila de ataque, de ônibus para Praia Grande, ainda na utópica, dadas as adversidades, vontade de conhecer os cânions. Gostaríamos de acampar no alto de um deles, mas além de sermos proibídos pelo Ibama, nem mesmo conseguimos chegar ao local. De Praia Grande até o Cânion Itaimbézinho, nosso objetivo, eram 18 intransponíveis quilômetros. Duas caronas tentaram nos ajudar, porém, no meio da serra que nos separava de nosso destino, esperamos nada mesmo do que 4 horas. Acreditem, nenhum carro passou, nenhum. Por sorte, antes do anoitecer, ao menos um carro voltando a Praia Grande surgiu e nos levou à pequena cidade. Lá encontramos um bar onde assistimos ao empate do Inter - imaginem o mau-humor do Alex depois disso, rs - e a vitória tranquila do São Paulo. Acampamos em um balneário na beira do rio Mampituba, e no dia seguinte, com uma carona e um ônibus, voltamos a Torres onde tínhamos deixado nossas coisas.

Os últimos dois parágrafos relataram os dias de espera ao Paragua, ou melhor, à minha blusa, contudo, na tarde de sexta-feira só encontrei o primeiro: a blusa não veio. O Paragua até tentou, mas um desencontro ocorreu e nada feito. Pegamos então uma carona com o próprio Paragua em direção a Osório, ou pelo menos isso imaginávamos. O Paraguaçú disse que a Bina havia conseguido carona e talvez trabalhos para nós com um tio em Tavares, uma das cidades em nosso modificado roteiro, dado isso o acompanhamos a Canoas, onde NOVAMENTE encontramos a Sabrina!! Inúteis meus alertas ao Alex, novamente fica provado como é difícil se ver livre dessa garota!!!! Não é Sá??? Hahahaha!

Bom, sábado fui a um forró ao ar livre em Porto durante a tarde e à noite fui a Estrela, cidadezinha a uns 100km daqui, com o Alemão, outro grande amigo da cidade, curtir uma festinha de dança que teve por lá. Domingo um dia para descansar e hoje, segunda, aguardamos ansiosamente notícias da Bina dizendo o dia e o horário da nossa carona até Tavares, esperamos partir amanhã mesmo.

Não vou, todavia, declarar quais nossos planos para os próximos dias, afinal, dada a nossa experiência nesses assuntos, sabemos que eles não se concretizarão. Acho que vou me desplanejar, e deixar a partir de agora, a vida me levar.

Vadiando agora sem rumo, um grande abraço a todos e muito obrigado pelos comentários.

Andejo.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Andejo Vadio e os 4 Cantos do Mundo

Reparando nos meus próprios momentos inesperados de euforia e reparando em sinais do Alex, que às vezes ri sem propósito, canta achando que não podemos o ouvir e fica inúmeras vezes olhando fixo pela janela sem nada falar, acredito que nossa viagem enfim está começando.

Esses meus primeiros 35 dias na estrada foram um bom começo; abracei pessoas que amo, revi antigos amigos, visitei lugares que me fizeram perceber quanta saudade sinto de lugares que nem lembrava, senti sensações a muito tempo guardadas, que esperavam ansiosamente pelo momento de reconquistar seus espaços. Escalei montanhas, caminhei por estradas desertas que tocavam o horizonte, tomei chuva até não ter um mínimo pedaço seco em mim, congelei com o vento nas caçambas de caminhões e cominhonetes, apreciando em silêncio paisagens que não parecem pertencer a nossa realidade. Conheci pessoas que me ajudaram sem motivo, que se encantaram com minha coragem, que se espantaram com minha loucura, que tiveram pena ou quem sabe orgulho de mim. Outras, através de mim sentiam-se aventureiras, enquanto outras se colocavam no lugar de meus pais e me davam bronca, mas ainda como meus pais, me acolhiam. Hippies, beatniks, drogados, religosos, voluntários e muitas, muitas pessoas comuns, com suas peculiaridades, passaram por meus olhos nesse efêmero, porém eterno, curto período de tempo.

A partir de agora, porém, muita coisa será diferente. As acolhedoras casas de amigos não serão mais certas, não poderemos mais imaginar nos momentos de fome o momento em que pisaremos em solo conhecido, com praticamente um banquete a nossa espera, como o sempre agradável arrozfeijãobifeebatatafrita; em breve as caronas não mais perguntarão "Ooo guri, para onde vai?", ao menos não no idioma que estou acostumado a ouvir.

Entretanto, ao mesmo tempo que isso me causa um certo receio, me causa um enorme prazer, comparável a momentos incomparáveis, com toda sua incoerência. Volto a sentir aquela adrenalina de menino que quer virar homem, que explodiu no meu sangue quando deixei minha segurança na primeira viagem que fiz, no exato momento em que vi meus pais ficando ao longe com o afastar do barco que me levava para lugares desconhecidos. Sinto que enfim vou viajar por mares nunca dantes navegados, ao menos por mim, e que agora tenho a oportunidade de completar aquele sonho, o qual fui acordado a anos atrás e desejei arduamente que continuasse todas as noites ao deitar a cabeça no travesseiro.

Aquele louco desejo será saciado, enfim, e chegou o momento em que todas contra-recomendações serão esquecidas por completo. Chegou o momento em que todas a línguas faladas nesse mundo serão a minha língua materna, em que todos os bancos de praças, campos verdejantes e planícies brancas de neve serão a minha casa. Em que todo singelo cidadão do mundo me alimente será meu pai, e que todo agasalho que me aqueça será minha mãe. Cada criança que eu veja correndo atrás de uma bola na rua será o sobrinho que eu não conheço e toda vez que aquela criança cair no chão e for ajudada por outra, vou imaginar que essa segunda é minha sobrinha que não poderei ver dar os primeiros passos, e nesse instante, vou as amar de forma incondicional. Vou temer a cada instante perder pessoas as quais não poderei me despedir. Não só as pessoas, como também meu cachorro, por exemplo, coitado, velho, sempre alegre, que me acompanhou por grande parte da vida, e que ao final de anos correndo o mundo, pode ser que a única coisa que encontre dele quando voltar seja a lembrança ao olhar para o sofá que ele teimosamente insistia em se deitar.

Enfim, chegou a hora do andejo andar, vadiando em busca de sabedoria, aproveitando cada instante de liberdade. E repito:

Sou o Andejo Vadio, alguém com uma incontrolável vontade de viver, sentir, explorar cada canto deste planeta, e por acaso farei tudo isso, acreditem ou não. Liberdade, coragem e um pouco de loucura, paixão pelo desconhecido, adrenalina e consciência, busca pela sabedoria.

Estejam a vontade para viver tudo isso comigo...

...sejam bem vindos ao conto de fadas do Andejo Vadio.


sexta-feira, 12 de março de 2010

Passeando pela Serra

Como em viagens ocorrem mais imprevistos do que fatos planejados, muitas adaptações foram feitas em nossos planos desde a última postagem, aos poucos vou explicando quais.

Havíamos planejado ir na terça-feira até Gramado e Canela de carona com a Vanessinha, dona do apê que estamos hospedados em Caxias, porém logo depois de postar sobre isso no blog, ela acabou desmarcando os compromissos nas belas cidades da serra e então adiamos nossa visita. Para compensar fizemos uma bela janta, um rocambole de carne maravilhoso, com alguns amigos dela. Terça utilizamos para resolver algumas coisas por aqui. Em primeiro lugar fomos durante a manhã consertar minha barraca que havia quebrado em Urubici, e tivemos sorte. Um cara muito louco, Marcio, fez o serviço com maestria, além de nos dar de brinde uma lona para colocar em baixo das barracas e uma vareta extra caso mais alguma se quebre. Durante a tarde, saímos em busca de emprego, mas ao achar um sebo e lá gastar horas preciosas, acabamos deixando de lado o objetivo inicial. O dia seguinte dediquei à internet, reformulando todo o layout do blog, tentando o tornar mais atrativo, e enfim coloquei fotos a disposição de todos. À tarde fui dançar um pouco com a Vanessinha, e mais tarde ainda dei uma aula com ela em sua academia, matando assim a saudade das salas de aula, afinal, não exercia a profissão desde o início de dezembro.

Decidimos finalmente conhecer a cidade na quinta-feira, quando visitamos algumas praças, as principais ruas, o centro e duas belas igrejas: Catedral Diocesana e Igreja de São Pelegrino, esta última com belas pinturas em suas paredes e teto. Continuamos o roteiro turístico no dia seguinte, pegamos a moto da Bina e fomos a Nova Petrópolis, Gramado e Canela. Visitamos um labirinto de cerca-viva, alguns monumentos, mais igrejas (eu sei, eu sei, mas são de graça e nós somos pobres!!!), um alambique e uma viti-vinícola (e provamos seus produtos!!!), além de algumas fábricas de chocolate, que apesar de não darem o que procurávamos, empregos, ao menos nos deram amostras grátis, que mais aumentaram do que saciaram nossa vontade despertada pelo incrível cheiro desses lugares.

Eu disse que tinha feito tudo isso em uma moto, certo? Bom, quase... Era uma scooter, Burgman 125cc, com rodas de 10", que eu e o Alex utilizamos para subir e descer serras e serras que separam todas essas cidades! Para completar um de nós teria que usar um capacete rosa, afinal a Bina não poderia ter um capacete discreto. Eu perdi no cara ou coroa.

Queríamos visitar também um templo budista em Três Coroas, mas não queríamos pegar estrada à noite na serra com uma "moto", então a precaução ganhou e voltamos para Caxias do Sul.

Estamos ansiosos para sair do país, portanto cortamos o Parque Aparados da Serra do nosso roteiro. Ou seja, se nada extraordinário acontecer, a partir de agora só iremos em direção ao sul, indo em busca do Chuí e quem sabe atravessando a fronteira em uma semana ou duas.

Bom, para terminar gostaria de agradecer aos comentários e incentivar para que realmente o façam e expressem neles suas opiniões, afinal, escrevo para que leiam, e só sei que isso está acontecendo e se estou sendo interessante e conciso através do retorno de vocês. Sejam sinceros!

Um grande abraço a todos e me despeço com a tradução de um poema de T.S.Eliot:

Recomeçar

Não há amor perdido, nem se fingem milagres,
Não reparto o destino que me expia em saudades...
E o grito ecoa profundo;
"Quero o meu mundo!"
O assalto recomeça, o espelho fascina,
Sigo encoberto, o quebranto domina...
Mas a vida desalinha!
Sepulto a ruína, ressurjo em apreço,
E de novo, recomeço.

Só quem se arrisca a ir longe demais
descobre o quão longe se pode ir.

Com saudades,

Andejo

segunda-feira, 8 de março de 2010

Titio Andejo

Bah!!! Esta postagem é só pra comemorar! Além de hoje eu ter completado 1 mês na estrada, as 3 e meia da tarde nasceu meu segundo sobrinho, Giovanni, com 3kg e 49 cm, de parto normal! Parabéns a minha irmã e meu cunhado, e parabéns a mim também. Quero aproveitar para dar parabéns a todas as mulheres pelo seu dia internacional, em especial minha grande mãe e minha duas irmãs, responsáveis por colocar meus sobrinhos, Giovanni e Sofia, no mundo! Amo vocês cinco e sinto muitas saudades!

Aproveitando a deixa, completo esta postagem avisando que estou agora em Caxias do Sul. Ontem terminei minha estada em Porto Alegre com um bela massa preparada pelo Paraguaçu, que hoje de férias viajou para Floripa, nos deixando na rota do sol, que leva do litoral gaúcho ao interior do estado. Com apenas uma carona chegamos a Caxias e fomos recepcionados pela Sabrina e pela Vanessa, duas amigas residentes por aqui. Amanhã conheceremos Gramado e Canela e à noite voltaremos a Caxias onde ficaremos por uns dias.

Nada de muitas novidades, afinal postei ontem à tarde.

Grande abraço do feliz Titio Andejo!

domingo, 7 de março de 2010

Long Nights

Finalmente estou novamente por aqui! Depois de longas noites perdido pelo mundo, estou agora em um local onde posso voltar a escrever, e serão muitas linhas, então tomem assento.

Começarei esta postagem pelo recomeço. Assim o considero porque voltei a viajar com o Alex, e viajar com um amigo é bem diferente de viajar sozinho. Saímos de Getúlio Vargas na segunda-feira, logo cedo, pegando um ônibus até Erechim e outro até um posto fiscal na fronteira do Rio Grande com Santa Catarina e ali ficamos algumas horas até a primeira carona do dia. Foi com um caminhoneiro que estava indo pra Curitiba que parecia ligado na tomada, não parava de falar nem para respirar. Andamos com ele algumas horas, até que nos deixou num trevo, onde nossos rumos se separavam, e neste local não ficamos mais do que alguns minutos, um furgão que fazia entregas para uma padaria nos levou até Catanduvas, e já ao meio-dia o motorista, Jair, nos garantiu o almoço nos dando algumas das iguarias que ele carregava, e nos instruiu a andar em direção ao final da cidade, onde teria outro trevo.

Andamos de baixo de sol forte, carregando cerca de 25 kg cada por alguns quilômetros, até vencermos uma longa subida, e o prêmio foi a melhor carona do dia. Jaime, um cara extremamente cabeça aberta, com idéias interessantes e alguns filhos no mundo. Com ele seguimos até Lages, fez questão de nos pagar um lanche na padaria de sua irmã, nos deixou na saída da cidade e disse que passaria por ali ao final do dia, e caso não conseguíssemos carona, nos daria pouso e alimentação. Nos deu seus telefones e partiu. Assim como nós com um velho carrinho destruído de um cara pobre, e bem sofrido, mas com um grande coração. Também nos levou a sua casa e nos ofereceu um café. Dali embarcamos num caminhão que voltava vazio para Urubici e como a cabine era pequena o Alex foi na caçamba. Quase morri de rir. O motorista era maluco e corria loucamente pela sinuosa serra catarinense, e com certeza fazia meu companheiro de viagem ser jogado de um lado para o outro, pra cima e pra baixo, tentando fazer com que nossas coisas não se despedaçassem. Chegamos no nosso destino perto das 7 horas e procuramos a secretaria de turismo, que obviamente estava fechada. Um rapaz que passeava com um labrador marrom perguntou se precisávamos de ajuda, e dissemos que procurávamos por um local para acampar, de preferência de graça, e então nos ofereceu seu quintal. Seu nome era Marcos, um gremista que recém abrira uma operadora de ecoturismo na região. Nos ofereceu o banheiro para tomarmos um banho e nos explicou tudo sobre a cidade.

No dia seguinte alugamos umas bicicletas e fomos em direção ao CINDACTA II, a 1808 metros de altitude, localizado no Morro da Igreja. Já no começo da subida não aguentava mais e já a ponto de desistir fomos salvos por uma ranger que subia para fazer manutenção nas antenas da estação. Colocamos as bicicletas e subimos na caçamba, de onde tivemos uma incrível visão daquele incrível lugar e nos deliciamos com o ar puro e gelado nos nossos rostos. O tempo estava perfeito, aberto, com nuvens apenas no horizonte. Gastamos um certo tempo tirando algumas fotos e começamos a descida. Já no começo a corrente da minha bicicleta caiu, enroscou nos raios e arrancou mais da metade deles, com isso a roda travou e o atrito abriu um grande buraco no pneu. Dei muita sorte de não cair, sabe-se lá onde ia parar se tratando de uma descida tão íngreme. Fomos socorridos por um casal com um troller, Adriano e Débora, que vieram de Campinas e estavam rodando toda a região. Prendemos a bicicleta estourada no carro e desci a serra com eles, enquanto o Alex desceu com sua bicicleta praticamente sem freios. Esse casal ainda pagou minha entrada numa cachoeira privada, pois o Alex desceu com a mochila que estavam todas as coisas, inclusive minha carteira. Conversamos bastante e eles me falaram de histórias sobre a patagônia e o deserto do Atacama, lugares que foram sempre de carro. Devolvi a bike destruída ao hotel que não me cobrou nada dos danos, afinal o que ocasionou o acidente havia sido um defeito mecânico e não displicência minha. Quando cheguei novamente na casa do Marcos tive minha maior decepção: minha barraca estava quebrada, uma vareta se partiu e por sorte a lona não se rompeu. Até o momento não consegui consertar. Depois disso deixamos a cidade com duas caronas, a primeira até Bom Jardim da Serra e a segunda até Tubarão, onde achamos um bar para assistir o jogo do Brasil. Devido ao horário, por volta das 19 horas desistimos da carona e pegamos um ônibus até Laguna e quando chegamos na cidade dormimos ali mesmo na rodoviária.

Vários tipos passaram e conversaram com a gente, mas a partir de uma certa hora não mais fomos incomodados. Nos revezamos acordados, e aproveitei, durante o meu turno para acabar o livro que estava lendo - On th Road, Jack Kerouac. Dormimos aproximadamente umas 2 horas cada e saímos logo ao amanhecer da rodoviária para conhecer o centro histórico de Laguna. Passamos no marco de tordesilhas (A linha imaginária do tratado entre espanhóis e portugueses passava em Laguna), e novamente adormecemos debaixo de um sol matutino nos bancos da praça em frente ao Museu Anita Garibaldi, a mais notável cidadã que a cidade já teve. Com mais essas duas horas maravilhosas de sono, conhecemos o resto da cidade. Além do museu, conhecemos a igreja de Santo Antônio, uma bela construção com muito dourado e forte influência da arquitetura barroca, além da casa que foi propriedade da Anita Garibaldi. O centro histórico todo em si é muito bonito, mas decidimos partir para o farol de Santa Marta ainda antes do almoço. Ainda na balsa arranjamos quem nos levasse até lá. Um lindo lugar onde tiramos muitas fotos e andamos a béça pela região. Ao final da tarde joguei bola com uns nativos e com os salva-vidas. Levei uma cotovelada no queixo que estou sentindo até agora.

Com apenas uma barraca não teríamos como acampar e decidimos dormir ao relento próximo a uns pinheiros perto da saída da cidade, mas o mau tempo nos fez pedir abrigo para um posto de polícia, e na garagem deles passamos a noite. Já preparávamos uma sopa quando o cabo Nunes, policial de plantão no local, dividiu sua janta conosco. Noite fria e chuvosa, e com o forte vento acabamos nos molhando um pouco. Como em todos os dias desde que voltamos a viajar juntos, levantamos antes das 6 horas e partimos para a estrada. Objetivo: Torres. Horas e horas e quase não passavam carros, e decidimos caminhar até a praia do Camacho, local mais movimentado e já asfaltado. Um pouco antes de chegarmos lá fomos novamente premiados, uma carona diretamente para Torres. Arthur, um executivo de um banco em Porto Alegre estava em férias no Farol, mas devido ao mau tempo decidiu passar os últimos dias em Torres. Nos pagou um café da manhã e ao som de Etta James, Los Ermanos e Amy Winehouse nos levou até Torres. Disse-nos que iria para Porto Alegre no dia seguinte, e nos deixou seu telefone para entrarmos em contato se a carona interessasse.

Rodamos por toda cidade, Praia Grande, Prainha, Praia da Cal e Parque da Guarita. A noite liguei para a Sabrina, minha próxima anfitriã e confirmei que ela estava em Porto, então mandamos uma mensagem para o Arthur, mas não obtivemos resposta. Fomos buscar alguma coisa pra comer e descansamos um pouco numa praça qualquer. Eis que surge um moleque puxando papo conosco, perguntando se éramos mochileiros, começamos a conversar, seu nome, Rafael. Outro amigo dele se aproximou, Guilherme e nos convidaram a ir ao apartamento do Rafael fazer um som. Um era estudante de arquitetura e outro de odonto. Bebemos e comemos, conversamos sobre Kerouac, London, Tolstói e Thoreou, além de muita música de qualidade: sambas, blues, rocks, além de várias composições do Guilherme, músicas incríveis por sinal, não duvido que faça sucesso algum dia. Depois de dois dias e meio sem tomar banho, o fizemos na casa dele que também ofereceu lugar para dormirmos. Não dormíamos num colchão há dias, na realidade não dormíamos direito há dias. Acredito que serão longas amizades as que foram feitas nesse dia.

Acordamos lá pelas 9h da manhã e já arrumávamos nossas coisas para partir quando recebemos uma ligação, era o Arthur dizendo que já estava indo para Porto e perguntando onde estávamos para vir nos buscar, e dessa vez ao som de Eric Clapton deixamos o litoral e fomos até a Capital Gaúcha. Nos deixou no aeroporto, nos despedimos e algum tempo depois a Sabrina veio nos apanhar. Instantes depois de chegarmos em seu apartamento (que fica em Canoas), seu marido, Paraguaçu, também amigo de longa data chegou e fizemos o primeiro churrasquinho e na primeira noite, forró. No sábado fomos fazer outro churrasco na casa de uma amiga deles e bebemos do meio dia à meia-noite. Muita carne, cerveja e samba e novamente uma cama confortável pra dormir. E finalmente cheguei ao dia de hoje, comendo os restos do churrasco o dia todo e olhando na internet o que tem acontecido nos últimos dias. Amanhã partiremos pra Caxias do Sul, tentaremos arranjar algum trabalho por lá pra juntar mais alguma graninha antes de sair do país.

Creio que poucos tiveram paciência de ler até aqui, mas tenham certeza que reduzi ao máximo e até omiti muitos fatos importantes para o texto não ficar tão longo. Espero não demorar tanto para postar novamente.

Um Abraço,

Andejo.